Ser ou não ser professora

Luciana Sena

Boy (8-9) holding apple behind back, looking at teacher in classroom, focus on boy

Cá entre nós, quem me conhece sabe que eu nunca quis ser professora, mas amo a profissão que me escolheu!

– Mas gente, você é tão inteligente, por que escolheu ser professor? Você poderia ter feito Direito, ter prestado um concurso e ó nunca mais iria trabalhar! Deu bobeira demais…

– Então, assim…você só dá aulas?

–  Professor tem vida boa, duas férias por ano, emenda feriado, todo ano faz greve…Trabalha nada! Dar aula é fácil demais…é só ficar lendo o que tem nos livros…

– Nossa, mas você foi para a França para ser professora…aff..

Perguntas e comentários tão profundos quanto um pires, ou seja, pequenos e rasos! Não é fácil, a princípio a gente até tenta informar, em seguida aprende a se defender. Finalmente descobre que pode e deve ignorar certas coisas ao longo da vida. São colocações que não valem a escuta, a réplica, a retórica, o desgaste e muito menos a perda de tempo.

Como pode ser incoerente a profissão de professor! Um das poucas que combina incrivelmente o desprezo social com a admiração mais pura. Não passamos de maravilhosos coitados. Evidentemente, uma parte dessa admiração é pena, a outra, é gratidão e reconhecimento. O desprezo, nada mais é do que o resultado de uma sociedade que valoriza o sucesso material, o poder aquisitivo e o status profissional. Cabe lembrar que ostentar ao máximo, fenômeno que independe da classe social, serve para provar que “deu certo na vida”! Entretanto, raras são as carreiras que conciliam tanto críticas severas e pessoais quanto elogios e carinho sinceros e valiosos.

Lembro que, quando era bem pequena, ao ser questionada sobre o que queria ser quando crescesse, respondi:

– Vampiro!

Eu realmente achava que era profissão! Mais tarde tentei brincar de “professorinha”, mas minha irmã não sabia escrever direito e meu irmão não sabia segurar um lápis sem ficar mordendo. Eles me estressavam tanto que não deu muito certo. Aí resolvi tentar a vida na costura, tentei fazer roupas para a Barbie, outro fracasso. Já na época da adolescência eu não fazia nenhuma ideia do que iria fazer da vida, o que é bem típico da idade. Cogitei, num momento de loucura, cursar Medicina porque acho uma das profissões mais bonitas, mas não sou fã de sangue – deve ser por isso que até hoje não virei vampiro, mas ainda conservo esse sonho: ser eternamente jovem, bela e ainda rica me parece um bom plano de vida!  Enfim, escolhi Arquitetura, mas no meio do caminho apareceu o francês e tudo mudou! Certo é que nunca tive um conhecido que tenha manifestado o desejo de dar aulas quando fosse adulto e tivesse que abraçar uma carreira. Nem eu o fiz!

Definitivamente, eu não escolhi ser professora! E acho que maioria de meus colegas não escolheu também… Os mais felizes na carreira não escolheram, fomos escolhidos!

Não virei professora porque me formei em Letras, foi muito antes da conclusão do curso que eu me descobri nesta profissão e a exerço com muita satisfação onde quer que eu esteja. Não adianta fazer direto graduação, mestrado e doutorado, nada disso vai te preparar de forma prática o suficiente. Ninguém sabe dar aulas até entrar em uma sala de aula. Experiência conta muito mais. Se está cursando licenciatura, dê um tempo, vá para sala de aula, retome depois. Eu retomei os estudos 11 anos após a conclusão da licenciatura em Letras e fui contratada por uma empresa que considerou como fundamental minha experiência e não apenas meus diplomas. Aliás são duas empresas e estou em processo seletivo para uma terceira.

Professor dá aulas, ensina o que se deve aprender, passa o ponto e faz os exercícios, exige memorização, cobra disciplina, bota ordem. Minhas aulas sempre foram uma “bagunça” completa. Confissões, criação de laços, piadas, café, compreensão, biscoitinho, afetividade, desconstrução de paradigmas, provocação…

Eu sempre me interessei muito mais pelas motivações, percursos e projetos que os fizeram chegar até à mim. Eu gosto de conhecer meus alunos, adoro as histórias de vida de cada um, torço, vibro e às vezes fico triste junto. Adoto as famílias porque elas sempre aparecem nas dinâmicas de conversação, aos poucos vou conhecendo a forma como eles trabalham e curtem a vida. Eu não sei ser professora como alguns querem que eu seja, daquele tipo que trata os alunos como números de matrícula. E portanto, acabo de entender que, na verdade, eu não sou professora. Por isso, talvez, dê tão certo, embora já tenha me custado várias adversidades e até uma indisposição no estágio que fiz aqui na França.

Assim como eu, conheci vários outros colegas que atuam aqui em Paris imersos no ensino de idiomas, indiferentes ao estereótipo de professor que a sociedade construiu e exige que seja correspondida. Geralmente, e bem ironicamente, são reconhecidos como os melhores professores dos centros em que trabalham. Não escolheram a profissão, acabaram nela por circunstâncias da vida adulta. E hoje integro uma equipe com a qual me identifico totalmente. As aulas são personalizadas, cada aluno tem uma demanda específica, são aulas para formar executivos que lideram projetos internacionais em vários setores.

Uma leve mudança: estou trabalhando também com o ensino do português língua estrangeira! Em paralelo estou a aprender o português de Portugal ora pois! Estou amando e apaixonadinha por Portugal, talvez faremos uma confraternização em Lisboa em julho…eeebbaaa! Outro sonho realizado: minhas aulas exigem o uso de outros idiomas como espanhol, inglês e francês para aprender a minha língua e cultura!

Sinceramente, quando discutimos, somos conscientes de que poderíamos, com os mesmos acasos que nos obrigaram a “dar aulas”, ter tomado outro rumo (mercado editorial, tradução, revisão). Mas fomos acolhidos como imâ pela dinâmica para a qual parece que temos um talento inato. De repente passamos a descobrir que somos bons nisso, que sabemos bem o que é para ser explicado, de que forma a explicação causa mais efeito, sabemos como encantar e provocar, e,principalmente, transformar milagre o conhecimento.

Acabei o primeiro ano de mestrado e foi muito mais complicado do que eu imaginava. Tive a sensação de ter cursado uma formação tipo “Malhação”: infantil, desnecessária e nada profissional. O curso se apresenta de uma forma e o executa de outra. É um mestrado profissional no qual a maioria dos alunos nunca trabalhou. Só descobri essa característica no início das aulas. No fim do primeiro semestre estava desmotivada, mas a gota d’água foi rever conceitos que vi pela última e única vez no início dos anos 2000. Não existe e nem querem que exista inovação, e quando há é desclassificada ou criticada imediatamente.

Sem generalizar, mas a maioria dos professores universitários que eu tive se colocam acima dos alunos, castram violentamente a criatividade, reforçam a insegurança dos alunos através de notas medíocres – aqui tem uma loucura chamada constante macabra = professor bom é aquele que dá notas baixas, porque o aluno sabe muito pouco e ainda precisa aprender muito para chegar lá. Oi? Fiquei chocada com a crueldade! Ela é aplicada desde os primeiros anos de estudo, ou seja, à partir dos 7 anos. Por isso, empreendedorismo é algo muito novo na França, eles tem medo de ousar, de arriscar.  E ainda temos as observações algumas vezes perversas que expõem os alunos. Várias vezes eu me senti mal com relação à alguns colegas que foram massacrados em suas apresentações porque não falavam alto o suficiente ou só porque tinham um sotaque diferente. Não era o conteúdo que estava equivocado -na minha opinião isso deveria ser o mais importante – mas era uma implicância por não serem como eles e aí como se já não bastasse o nervosismo de estar diante desses “deuses”, muitos foram humilhados por  razões sem fundamento acadêmico. Depois de assistir uma apresentação passei a sempre escolher entregar a versão escrita e não emitir um pio em sala de aula.  (Percebem como um professor pode ser um desmotivador?)

Eles privilegiam o ensino formal baseado nos anos 50 ou 60, totalmente desconectados da realidade do mercado de trabalho atual. A gente tem a impressão de que aulas são elaboradas por eles e para eles. Eles não se cansam de se ouvir! As pesquisas sem fim protegidas pelos muros acadêmicos é a fonte de todo e único conhecimento, fora de lá está tudo errado! Outra questão a ser colocada é alta demanda de realizações de trabalhos de pesquisa, o que me faz pensar se estes não seriam para abastecer um acervo para que sejam usados pelos professores em suas próprias pesquisas, pois não há retorno seguido de comentários para orientar, aperfeiçoar, nada, só nota e eu já cheguei num ponto da minha vida que já entendi que não é uma nota que define quem somos, particularmente eu prefiro feed-back. Este tipo de professor estaria realmente interessado em ajudar o aluno a progredir? Fica a questão!

Enfim, agradeço por ter tido a oportunidade de adquirir experiência e autonomia suficientes para integrar um mercado de trabalho competitivo, em constante atualização e possuir características que me impulsionam e encorajam a me manter firme nas minhas convicções. Se é para ser esse tipo de profissional descrito acima: não contem comigo!

Bon week-end!

Bisous

Lu Sena

 

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Paris em 7 dias

SIMPLESMENTE PARIS !!!! Esta sugestão de roteiro pretende levar o turista para uma viagem bem completa pelos principais monumentos e regiões de uma das cidades mais lindas do mundo! Foi elaborado com base na minha experiência, na minha paixão pela cidade e pelo idioma. Para ilustrar as situações usei os desenhos da fera Inslee Haynes entre outros artistas internacionais que desenham Paris com muita paixão e delicadeza! Como “louca” pela França, visito sempre que posso e cada viagem me encanta por uma particularidade em especial. Paris sempre tem novidade! E a cada visita, acrescento uma região francesa. O interior francês é um escândalo, mas fica para o guia Tour Gastronômico: Conhecendo a França através de sua cozinha. Paris é uma cidade que não decepciona e nos transforma. Impossível ficar indiferente, um pouco dela vem embora com a gente.

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